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100 dias de governo e os avanços nas pautas ambientais


O retorno à pauta ambiental é um dos pilares do novo governo Lula, o presidente anunciou suas propostas ainda durante a COP 27 e as discussões entram em foco no início de seu mandato

Antecedentes: o Brasil de volta à cena ambiental internacional

A pauta ambiental constitui uma das prioridades do novo governo Lula. Desde a eleição, afirmações públicas do até então presidenciável indicavam que seu plano de governo traria uma união entre o crescimento econômico e o respeito ao meio ambiente. Em meio a eleição, a aliança com Marina Silva já trazia sinalizações sobre como o novo governo iria encarar as questões ambientais, mesmo que com grande pressão da bancada agrícola. Quando tomou posse no ministério, Marina Silva informou que o plano do atual governo seria retomar o protagonismo brasileiro na área ambiental, e que não iriam ficar parados em relação à emergência climática pela qual o mundo está passando.

Diferentemente de seu antecessor, Lula se elegeu com pautas de defesa do meio ambiente e do clima, trazendo um cenário mais favorável ao Brasil para negociações acerca destes temas. Ainda em 2022, durante a 27ª Conferência do Clima da Organização das Nações Unidas (COP27), Lula comparece à conferência a convite do presidente do Egito e do Consórcio Interestadual de Desenvolvimento Sustentável da Amazônia Legal. Em sua comitiva, estiveram presentes nomes chave como Simone Tebet, Marina Silva e Fernando Haddad que viriam a ser ministros com influência sobre o plano do governo para o meio ambiente e o desenvolvimento sustentável.

Em seu discurso na COP, reforçou a importância de se conter o avanço da extrema-direita autoritária e antidemocrática e do negacionismo climático no mundo, ao mesmo tempo em que anunciou que o Brasil estaria de volta para reatar os laços com o mundo e ajudar novamente a combater a fome, cooperar com países pobres. O Presidente eleito aproveitou ainda para anunciar que o combate à mudança climática teria o mais alto perfil na estrutura de seu novo governo. Lula se reuniu ainda com uma comitiva do governo dos EUA, liderada por John Kerry, buscando acordos e investimentos para ações contra o desmatamento na Amazônia. Nessa ocasião, por exemplo, Kerry disse estar confiante de que Lula trará uma mudança na abordagem do Brasil em relação ao meio ambiente.

As primeiras impressões deixadas na COP27 viriam a ser reforçadas pelo grupo de transição para o meio ambiente. No primeiro relatório técnico do GT meio ambiente, foram elencados quatro eixos de atuação prioritária: a recuperação do protagonismo internacional do Brasil na agenda ambiental; a recomposição do orçamento para meio ambiente; a reorganização (organograma e pessoal) do Ministério do Meio Ambiente e suas autarquias; e a revogação de decretos do governo Bolsonaro que enfraqueceram a política ambiental – temas também abordados pelo OPEB e outras organizações durante os últimos quatro anos.

No início do ano de 2023, esses planos já começaram a se mostrar internacionalmente. Em janeiro, os ministros Fernando Haddad do Ministério da Fazenda e Marina Silva do Meio Ambiente e Mudança do Clima participaram do Fórum Econômico Mundial em Davos, onde reforçaram as posições de Lula durante as eleições, indicando que o plano do atual governo é reindustrializar o Brasil com base na transição ambiental e na integração regional. E ressaltaram, ainda, a intenção do Brasil em receber a COP30 em 2025, além da reunião do G-20 no ano de 2024 e que a agenda internacional de Lula dialogaria sobre paz, desigualdade e o meio ambiente.

A nova diplomacia ambiental EUA-Brasil

Em janeiro de 2021, John Kerry assumiu um recém criado posto do governo Biden, o de enviado especial do presidente para mudanças climáticas, em uma missão de recuperar a credibilidade estadunidense nos assuntos ambientais e, claro, fazer com que os EUA se torne um exemplo no combate ao aquecimento global. Kerry, que atualmente também ocupa o cargo de senador, é um defensor de longa data de medidas para combater as mudanças climáticas e desempenhou um papel fundamental no desenvolvimento do Acordo de Paris, em 2015, quando era Secretário de Estado dos Estados Unidos. Ao assumir o cargo, afirmou em uma rede social que os “Estados Unidos logo terão um governo que trata a crise climática como a ameaça urgente à segurança nacional que ela é”. Já em seus primeiros dias neste posto, Kerry reafirmou a importância de traçar e firmar acordos no que se refere à defesa do meio ambiente, principalmente com países emergentes, buscando protagonismo estadunidense.

Em fevereiro de 2023, o enviado especial dos Estados Unidos para o clima, em viagem ao Brasil, foi recebido pelo Vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, junto a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva; a ministra, substituta, das Relações Exteriores, Maria Laura da Rocha; ao presidente do BNDES, Aloizio Mercadante; e demais autoridades governamentais. O assessor-chefe da Assessoria Especial da Presidência da República, Embaixador Celso Amorim, e o Ministro da Agricultura e Pecuária, Carlos Fávaro, também acompanharam o encontro. Na ocasião, debateram-se temas como o combate ao desmatamento, fortalecimento de ações de adaptação e cooperação para o desenvolvimento sustentável e, claro, nas iniciativas norte-americana de contribuir para as iniciativas brasileiras de proteção e recuperação de florestas, de incentivo à bioeconomia e apoio aos povos indígenas, principalmente com o aporte de recursos. 

John Kerry revelou que o governo Biden está estudando a melhor modalidade de realizar esta contribuição, inclusive com aportes para o Fundo Amazônia. Essa aproximação baseia-se em uma das prioridades ambientais de política exterior do governo americano: a redução do desmatamento da Amazônia. A previsão é que o governo norte-americano repasse 50 milhões de dólares ao Fundo. Na ocasião, ainda, ao lado da ministra do Meio Ambiente, o enviado de Joe Biden anunciou a criação de um grupo de trabalho para o enfrentamento das mudanças climáticas no Brasil, com a finalidade de proteção dos povos indígenas, ameaçados pelo avanço do garimpo ilegal, por exemplo. A ministra brasileira e o enviado de Biden também assinaram um documento no qual ambos os países se comprometeram a fazer a transição para uma economia descarbonizada, ou seja, na busca pela transição verde.

De acordo com a ministra Marina Silva, há duas tarefas principais para superar a chamada crise climática: os países ricos têm o dever de promover a transição de suas economias para fontes limpas de energia e o Brasil tem o dever de conter o desmatamento. 

Novos desafios e tensões, contudo, também já se apresentaram. Em meados de março, a Ministra falou sobre o conflito de interesses ao tratar da Foz do Amazonas, também chamada de “nova fronteira do petróleo”. Embora muito pressionada por ativistas ambientais, Marina não se opôs de forma direta à extração de petróleo na costa da Amazônia, manteve posição técnica e revelou apenas que a exploração na região pode causar altos impactos. Este conflito poderá ter desdobramentos, visto que após a desistência de diversas multinacionais que buscavam perfurar a região, a Petrobras se tornou detentora de 100% das áreas, e já entrou com um pedido para realizar a primeira perfuração no local. O pedido deverá ser analisado e respondido pelo Ibama, que já declarou que nada será autorizado sem que se tenha conhecimento de todas as implicações necessárias, reiterando o compromisso da nova presidência com a preservação do território nacional.

Amazônia: fortalecer a OTCA e frear o desmatamento

Desde que assumiu o cargo, Marina Silva vem trazendo muito enfoque para as questões ligadas à Amazônia, como visitas às comunidades indígenas e de seringueiros, além da criação da Secretaria Extraordinária de Controle do Desmatamento e Ordenamento Territorial, com o objetivo de fazer com que o desmatamento deixe de ser a principal fonte de emissão de gases de efeito estufa no país.

No último mês de fevereiro, o desmatamento na Amazônia Legal bateu recordes, de acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). O sistema apontou um aumento de 61,8% de aumento do desmatamento no mês de fevereiro de 2023 em comparação ao mesmo período do ano anterior, sendo o maior registro até hoje desde o início da série histórica, em 2015.  Contudo, esse dado não deve ser analisado isolado: em janeiro de 2023, o Inpe apontou uma queda de 61% do desmatamento em comparação ao mesmo período do ano anterior. 

Tal cenário é explicado por Ane Alencar, diretora de Ciência do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM). A pesquisadora explica que os primeiros meses do ano, em decorrência de serem os meses mais chuvosos, são complexos no sentido da observação pelos satélites, devido às nuvens na região. Portanto, o aumento do desmatamento registrado em fevereiro pode ter ocorrido nos meses anteriores, visto que em dezembro já começa o período de chuvas na região. Dessa forma, Alencar alerta que o ideal é fazer análises de períodos de tempos maiores, de preferência de três a quatro meses. Por fim, a diretora analisa os meses de janeiro e fevereiro de 2022 em comparação aos deste ano, houve uma queda de 22% na área total de desmatamento na região de um ano para outro. 

De acordo com o relatório divulgado pelo Observatório do Clima, “Nunca mais outra vez: quatro anos de desmonte sob Jair Bolsonaro”, em março de 2023, a necropolítica ambiental dos quatro anos de governo bolsonarista levou a um aumento do desmatamento na Amazônia de 60% em comparação ao mesmo período anterior e o maior em um mandato presidencial, desde o início dos registros por satélite desde 1988, como também, a maior emissão de gases de efeito estufa nos último 19 anos, acompanhada de uma redução de 38% das multas aplicadas pelo Ibama em comparação aos quatro anos anteriores; além do aumento direto da violência em Terras Indígenas, contra trabalhadores rurais, comunidades tradicionais e perseguição a ativistas ambientais e servidores da área ambiental. 

Por fim, ainda segundo o relatório, houve também desmantelamento das proteções ambientais legais, com o apoio ao “Pacote de destruição” que tramita ainda no Congresso e a  escusa internacional com, por exemplo, a redução das metas de preservação climática do país no Acordo de Paris e o congelamento por quatro anos do Fundo Amazônia e o Floresta+ que somavam quase R$ 4 bilhões para serem investidos em desenvolvimento sustentável e monitoramento ambiental.  Diante disso, o novo governo Lula possui muitos desafios, não apenas avançar na agenda climática, mas rever as ecocidas políticas do governo anterior. 

Para tal, houve o anúncio, entre outras medidas, de duas ações internacionais em relação à Amazônia: a proposta de uma Cúpula sobre a Amazônia com os membros da  Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), além da retomada do Fundo Amazônia.

Em relação à primeira, um encontro dos nove chefes de Estados que compõem a OTCA no primeiro semestre de 2023, já era uma proposta na campanha eleitoral do petista para indicar o posicionamento brasileiro na questão ambiental como uma prioridade na agenda de política externa. Ao vencer as eleições, a sua primeira viagem internacional como presidente foi para Buenos Aires na 7ª Cúpula da Comunidade de Estados Latinoamericanos e Caribenhos (Celac), marcando o retorno ao grupo ao qual o Brasil havia saído em 2020. Em seu discurso na Celac, além de renovar o protagonismo brasileiro no grupo e defender o diálogo e o apoio mútuo dos países latino-americanos, o presidente também reafirmou o anúncio feito na COP27, no ano passado no Egito, de que convocará uma Cúpula dos Países Amazônicos no primeiro semestre de 2023. A iniciativa – inédita – reunirá os chefes de Estado da OTCA como gesto de valorização do grupo e de incentivo à cooperação entre esses países. 

No dia 1º de janeiro, como parte dos primeiros atos do governo petista, o presidente Lula assinou o Decreto Federal nº 11.368 que retoma o Fundo Amazônia, que havia sido paralisado, em 2020, por decreto federal do ex-presidente Bolsonaro. Tal decreto de Bolsonaro havia extinto o Comitê Técnico e o Comitê Orientador, impossibilitando o repasse dos recursos financeiros do Fundo para os projetos, enquanto, por sua vez, novo decreto do presidente Lula, restabelece as estruturas e atribuições de seus comitês e retoma as funções do Fundo. A resposta da comunidade internacional ao anúncio foi positiva, no dia 3 de janeiro, a Noruega anunciou que R$ 3 bilhões já poderiam ser investidos pelo Brasil e o presidente da Alemanha, Frank-Walter Steinmeier, prometeu que o país forneceria € 35 milhões para o fundo. Por fim, do encontro bilateral entre Joe Biden e Lula, foi divulgada pelo Itamaraty uma nota conjunta, no dia 10 de fevereiro de 2023, anunciando a intenção estadunidense de também aportar com recursos no Fundo Amazônia. 

Alemanha-Brasil: energia e meio ambiente na pauta 

Com o estabelecimento de um compromisso com a sustentabilidade nas prioridades da agenda política, as relações entre o Brasil e a Alemanha voltaram a se intensificar após a posse de Lula com a visita do chanceler Olaf Scholz, no dia 30 de janeiro deste ano. Entre os temas abordados, os principais foram relacionados à renovação do Fundo Amazônia e ao estímulo às políticas de promoção da transição energética.

Reativado pelo novo governo, o Fundo Amazônia, que havia sido desativado em 2019 durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, volta a desempenhar papel relevante como fundo que recebe doações estrangeiras voltadas para fiscalização e conservação da Floresta Amazônica e de toda sua biodiversidade. Com a presença oficial do chanceler, foram doados aproximadamente 170 milhões de reais, que serão divididos entre os subprojetos de combate ao desmatamento e bioeconomia.

Outro motivo pelo qual a Alemanha está tão interessada em estreitar o relacionamento com o Brasil, a ponto de ser o primeiro país-membro da Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) a visitar o Brasil após a mudança de Chefe do Executivo, não é segredo: é a urgência energética. Enquanto a nação latino-americana é abundante em energias renováveis, o país germânico vem sofrendo com a escassez de gás natural desde as sanções contra à Rússia (sua principal fornecedora), consequência do início da Guerra na Ucrânia. Logo, é vantajoso para a Alemanha fortalecer as relações com o Governo brasileiro para garantir uma diversidade de novas parcerias sobre fornecimento de energia para o futuro próximo.

Desse modo, a Parceria Energética Brasil-Alemanha foi reafirmada no dia 13 de março deste ano pelo Ministro da Economia alemão Robert Habeck e pelo Ministro de Minas e Energia Alexandre Silveira. Com isso, a produção de hidrogênio de baixo carbono será estimulada para exportação à Alemanha e para a utilização em solo brasileiro. 

Por Giovana Plácido, Giulia Monfredini, Larissa Lima, Lucca Franco, Vinicius Santos e Diego Azzi (Imagem: Ricardo Stuckert/PR)


 

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